quinta-feira, 28 de agosto de 2014

No parque do Inferno

Duas crianças estavam se banhando num rio de sangue quente, numa vila do Inferno
Elas se esbaldavam

Na vila, havia todo tipo de gente ruim
E naquela semana havia um demônio para fazer inspeções
Para saber se as penas estavam sendo cumpridas

Longe dali, havia o Centro do Inferno
Onde as decisões são tomadas
Chegou aos ouvidos de Lúcifer uma denúncia preocupante:
O Inferno, onde todos deviam sofrer eternamente em torturas e pagar pelos seus crimes
Estava tendo seus princípios violados
Afinal, seria um paradoxo qualquer prazer dentro dali
Por isso mandou o tal demônio inspetor àquela pequena vila

Ao chegar lá e ver as crianças se divertindo no rio, nadando, brincando, logo chamou suas atenções

-Crianças malditas, por que estão felizes, isso é proibido aqui! Voltem a sentir nojo do sangue, das carnes podres, voltem a sentir dor de queimadura

E as crianças responderam:

- Nós viemos parar aqui porque não obedecemos essas mesmas regras quando vivos. Fomos mortos com base nas mesmas regras, que nos amaçavam ter como punição vir ao Inferno

- Eu sei, mas é para sofrer, parem de achar graça, de se divertir

- Mas por que somos obrigados a sofrer? Por acaso estamos fugindo das sessões de tortura? Estamos faltando às aulas de espancamento? Ferimos alguma regra do Inferno?

O demônio pensou, e, então, voltou

No seu caminho, havia muita gente que ele, particularmente, achava chata

Gente que pegava nele, dizendo que fez o que fez por acreditar que é certo, que estava arrependido, que não merecia ficar sofrendo no Inferno.

- Sai daqui!, gritava, chutava-os, espancava-os, com muita raiva

Quando voltou ao Palácio, o demônio inspetor disse ao seus superior:

- Majestade, não havia nenhuma lesão às regras do Inferno.

- Mas havia crianças felizes no rio de sangue

- Sim, mas elas estavam junto com outras pessoas, que me suplicavam para sair dali, diziam que não mereciam estar no Inferno, que não sabiam que erraram, ou que estavam arrependidas. Aquela chatice de sempre. Elas nem sabiam que, na prática, podem sair do rio, ou do inferno, mas continuam achando que não merecem sofrer, que nunca voltarão a fazer nada de errado. Por isso continuam lá. Estão presas.

- E as crianças?

- Os que as executou estão no rio também, lamentando. Elas não. Não estão arrependidas nem acham que não mereciam estar aqui. Devo puni-las?

- Não, mas acho que quem está as denunciando para nós é um dos executores. Parece que ele já está sendo muito punido. Além de estar no Inferno, acha que não merece estar aqui e tem inveja dos pecadores que mandou executar. Não há o que eu possa fazer para punir essa pessoa. Quando ela veio aqui pedir a inspeção, senti algo próximo do que os humanos chamam de nojo. Ela já está mal o suficiente.